segunda-feira, 26 de maio de 2008

Apagão

Desde quando começamos a usar a palavra apagão em vez de blecaute? Eu sempre gostei mais de blecaute, blackout. Da palavra, não do "fenômeno" em si.
Hoje, pela primeira vez desde que vim pro Japão, passei por um blecaute. E não foi uma coisa rápida, não; durou quase duas horas, logo depois do almoço. Não era dia de chuva, não estavam fazendo manutenção da rede elétrica, e o mais estranho é que havia eletricidade nas quadras vizinhas e em alguns estabelecimentos na mesma quadra... hum... nada de mais pra quem veio de um país onde isso é tão comum que usar estabilizador pro computador é praticamente obrigatório. (Aqui não existe tal parafernália)
Confesso que foi um pouco emocionante, e eu estava torcendo para que a luz não voltasse e fosse declarado fim de expediente, assim nós sairíamos mais cedo pra tomar uma cervejinha. Acho que se alguém me viu quando as luzes se acenderam, deve ter visto uma cara não de alívio, mas de clara e iluminada decepção.

quinta-feira, 8 de maio de 2008

Shake & Squeeze

Tinha acabado de ir pra cama quando começou a tremer. Era mais ou menos 1 da manhã. Desde que cheguei a Tokyo já tinha sentido alguns tremores, que logo passaram. Nesse tempo me convenci de que esses leves balanços seriam coisa do dia-a-dia. Enganei-me. Balanços maiores estavam por vir, como foi ontem de madrugada. Não foi nada muito forte; grau 3 é algo a que os moradores de Tokyo parecem estar bem acostumados. Mas foi longo... não sei se foram segundos, pois para mim pareceram pelo menos dois minutos. Eu esperei parar, não parava, então eu pus meus óculos, acendi a luz, fui em direção à porta, calcei minhas pantufas, acordei o Thi, disse para ele que queria sair do prédio, ele hesitou, e foi quando ele finalmente alcançou a porta que o tremor parou. Essa foi a primeira vez. Houve mais um ou dois balanços que passaram logo até vir o maior, às 2 da manhã.
O barulho do prédio tremendo foi o que me assustou mais, e dessa vez eu não dei tempo pra sorte. Pensei em entrar debaixo da mesa da cozinha mas resolvi descer até o primeiro andar. Quando chegamos havia mais uma moradora assustada. Depois desse não houve mais tremores. Mas deu para ter uma idéia do que está ainda por vir.
Para piorar essa infeliz idéia da vida em Tokyo, hoje de manhã eu peguei o metrô lotado como nunca antes. Quase fui esmagada contra a barra de ferro, e também quase tive uma cãibra no braço por culpa do contorcionismo. Que sufoco!

domingo, 4 de maio de 2008

Copeira

Além de telefonista, eu também sou copeira. O salário, entretanto, não sobe. Aliás, tá bem, bem baixo. Nas empresas japonesas não é muito comum ter funcionários que se dedicam exclusivamente à limpeza ou a assuntos de cozinha. Todos ajudam a limpar, tirar o lixo, fazer café etc. No prédio onde trabalho há uma senhora responsável pela limpeza dos banheiros de todos os andares, mas ela é funcionária do prédio e não da empresa.

Minha tarefa, além de limpar minha própria mesa, como devem fazer todos os funcionários, é limpar a mesa da chefe, as pias e o espelho do banheiro feminino, servir cafezinho pros clientes e checar a cozinha de vez em quando. Nós temos uma cafeteira italiana ótima que prepara um espresso bem parecido ao cafezinho brasileiro, xícaras de porcelana Schmidt e açúcar União. Tudo pro cliente se sentir no Brasil... acho. Mas nós os funcionários tomamos café estilo americano, mais aguado, suficiente pra encher uma caneca, e que obviamente dura mais que um cafezinho.

O movimento na cozinha é grande. Movimento é força de expressão, já que a cozinha é tão apertada que se movimentar por ali é difícil. Infelizmente devido à minha falta de noção espacial eu não posso nem chutar quantos metros quadrados tem o cubículo que inclui a cozinha, os armários e o corredor pro banheiro, mas é tudo bem apertado, considerando também que há caixas de papelão amontoadas em todos os cantos. A gente vai passando pedindo licença e desculpas, deixa a caneca na cafeteira e só volta depois do café pronto porque não tem espaço para ficar esperando. Quando o movimento parece estar tranquilo, eu vou ver se não falta água ou café na cafeteira, açúcar nos açucareiros, gelo no congelador, tudo que soe assim redundante. Isso me ajuda a passar o tempo quando não tenho o que fazer e me salva de atender o telefone. E o café me mantém acordada.

sexta-feira, 2 de maio de 2008

Telefonista

Em abril comecei a trabalhar numa agência de viagens especializada na América do Sul. Apesar de ser brasileira e falar espanhol, eu tenho que trabalhar junto com os japoneses e atender aos telefonemas em japonês. Essa é a parte que eu menos gosto. Geralmente os japoneses se identificam logo no início da ligação, dizendo o nome da empresa em que trabalham e o próprio sobrenome, para que a pessoa do outro lado da linha não precise perguntar e possa transferir a ligação rapidamente. Não é o meu caso, já que eu quase nunca entendo o que eles dizem de primeira, salvo pelas pessoas que ligam com uma certa frequência. Então eu pergunto de novo, eles respondem, eu repito com um ? e eles corrigem, daí eu repito com um né? e aí sim posso transferir.

No Brasil eu sempre tinha que soletrar meu sobrenome porque ninguém entendia de primeira, e confesso que não gostava muito disso. Agora eu imagino a reação das pessoas que eu atendo. Elas devem se sentir indignadas... principalmente aquelas cujos sobrenomes dão em árvores aqui no Japão, equivalentes a Silva, Santos, Oliveira, etc. A probabilidade de alguém errar um nome desses é muito pequena, a não ser que ele(a) seja estrangeiro(a). :p

O pior é que, como novata, está pressuposto/subentendido que eu não tenho muito o que fazer e, portanto, é meu dever atender o telefone quando ele está tocando sem parar e todo mundo parece ter ficado surdo. É um alívio enorme quando algum brasileiro ou hispanohablante liga por engano na nossa linha (que é separada do atendimento em Português e Espanhol) e eu posso falar sem medo. Acho que vou ficar com trauma de telefone... isso porque eu já não sou muito fã. Prefiro os e-mails. Devo estar enerdeando cada vez mais. E considerando que adquirir algumas línguas estrangeiras tem como efeito colateral o esquecimento das outras, minha capacidade de comunicação está seriamente danificada. De repente o trabalho de "telefonista" sirva como uma terapia de choque.