terça-feira, 18 de março de 2008

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É... agora sim eu sinto o fim. Dia 25 é a minha formatura e dia 28 eu me mudo para Tokyo. Faltam poucos dias na minha vida de estudante, poucos dias na cidade de Kobe, poucos dias morando sozinha num apartamento gigantesco numa área residencial na montanha. Daqui a menos de 2 semanas eu vou estar num apartamento menor, bem mais caro, com mais uma pessoa, a 5 minutos da estação de metrô, a 20 minutos do centro de Tokyo.
Dá um pouco de tristeza ter que deixar esse apartamento que me fez sentir tão em casa, tão à vontade, mas ao mesmo tempo eu vou voltar pra cidade grande, rever amigos, começar uma vida nova. Hoje eu recebi a resposta de uma entrevista que fui fazer em Tokyo semana passada. Vou trabalhar numa agência de viagens, como eu queria. ^^

Essa será a terceira vez que eu me mudo, e a quantidade de coisas só aumenta a cada mudança. Mas dessa vez não vai dar para levar tudo. A primeira empresa de mudança que veio aqui em casa fazer um orçamento disse que para levar tudo ia custar uns 270 mil ienes (2700 dólares). Então eu decidi vender alguns móveis. Que decepção... Liguei para várias lojas, mas nenhuma delas comprava o tipo de móveis que eu tenho. Muito pelo contrário, elas cobravam para retirar os móveis e se livrar deles para mim. Aqui é assim:
1) Jogam-se fora móveis e eletrodomésticos, bicicletas e motos etc., mesmo em bom estado
2) Uma vez por mês a prefeitura coleta os móveis e eletros de pequeno porte
3) Quanto aos móveis grandes e bicicletas, pode-se ligar pra prefeitura e pedir pra que eles venham recolher de graça
4) Para jogar geladeiras, televisores, computadores etc., é necessário pagar uma taxa (25 a 50 dólares) de reciclagem, e pedir para alguma empresa de coleta ou pro fabricante para retirar o "lixo"
5) É difícil vender coisas usadas, mas existem várias lojas de coisas usadas (Recycle shops), ou seja, eles vendem o que conseguiram de graça, ou pior, recebem dinheiro de quem joga fora e também de quem compra

No fim eu vou gastar uns mil dólares para carregar minhas tralhas, menos a mesa do computador, aspirador, ventilador, mesinha da sala, cadeira giratória de couro (que dó, eu sei...), sofá, prateleiras, muitas roupas e sapatos. Vou levar comigo a lição de que viver no Japão é perigoso, anti-ecológico, caro e irracional.

terça-feira, 4 de março de 2008

Velhice

Ontem na estação de Osaka, enquanto eu esperava pelo trem parou uma senhora perto de mim, um pouco à minha frente, de forma que eu a via de costas. Ela usava um gorro preto, mas dava para ver os cachos grisalhos que cobriam sua nuca. Aquele gorro... tinha algo de estranho, parecia de lã mas era mais brilhante. Foi quando consegui ver a senhora de perfil que percebi o que os meus olhos não queriam acreditar - o gorro era, na verdade, uma peruca! Da pior qualidade, diga-se de passagem. A razão pela qual os cachos grisalhos estavam completamente descobertos pela tentativa de peruca não se sabe. Poderia ser a falta de cuidado da senhora, uma vaidade bem intencionada mas mal realizada, simples esquecimento ou confusão. O fato é que a visão que se tinha era ao mesmo tempo triste e ridícula.
Não foi a primeira vez que eu me deparei com uma dessas senhoras idosas usando acessórios um tanto "incomuns". Mas ontem, depois de me pegar boquiaberta encarando a espantosa peruca, eu pensei sobre a velhice. Será que quando eu ficar velhinha vão me chamar de cafona e careta? Ou pior, será que se eu tentar me manter atualizada, vão dizer que eu sou ridícula? Logo vou fazer 24 anos, o que ainda é pouco. Né? Mas às vezes me preocupo com o futuro distante. OK, antes de pensar na aposentadoria eu primeiro preciso de um emprego, e antes de pensar em netos eu tenho que ter filhos. Mas para me aposentar eu preciso começar a pagar impostos agora, e para ter uma família eu preciso de (pelo menos quero) uma certa estabilidade econômica.
Outra grande preocupação, acreditem, são as rugas. Com certeza eu estou sendo superinfluenciada pela poderosa indústria de cosméticos japonesa, além de ver japonesas quarentonas super conservadas aos montes. Mas o pior é quando me chamam de "senhora"... =( Daí eu me lembro daquela ruguinha precoce e desenterro um pote de creme para aliviar a consciência. Infelizmente os cremes anti-rugas aqui no Japão são para velhas a partir de 25 anos.
Alta expectativa de vida é sinal de melhor qualidade de vida, pra humanidade, pra sociedade. Mas individualmente falando, nem sempre é assim. Sim, hoje em dia se é muito mais saudável aos 60 do que se era há algumas décadas, mas o sistema previdenciário não mudou tanto assim, e a aposentadoria chega cedo demais para pessoas que ainda podem trabalhar. Passam-se os anos, a saúde se torna mais frágil, e nessas horas em que não se pode cuidar de si mesmo, alguém tem que fazê-lo: a família, enfermeiros, o hospital, um asilo. Acho que o pior da velhice é a solidão. É isso que tem levado muitos idosos a querer se aposentar definitivamente dessa vida. Pensando nisso, ter um motivo para se enfeitar com uma peruca e poder sair de casa sozinha(o) é um bom sinal.